terça-feira, 21 de agosto de 2007
Ó mar salgado!
Mar Português
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma nao é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa, in Mensagem
Praia das lágrimas
"Para Angola e em força. As mães redobram de actividades em suas lidas, preparam roupas, malas e compotas, à noite choram. Os pais sentam~se calados olhando para dentro. Se apanham os filhos distraídos demoram neles o olhar aflito, carne de sua carne, quem sabe se para canhão. E de repente ficam velhos. Nos cais de Lisboa as mulheres gritam, arrepelam os cabelos, algumas enrolam os filhos nos seus xailes, se pudessem escondiam-nos ao colo, outra vez pequeninos e só delas. Os pais passam em silêncio os dedos pelas fardas, não conseguem quebrar o pudor masculino do gesto e da palavra, mesmo que lhes apeteça agarrar nos filhos e protegê-los com os seus braços. Tempo de lenços a acenar, xailes negros, lágrimas, rugas, ó mar salgado, quanto do teu sal.
Vão-se os navios pela barra fora. Lisboa tem as suas barcas, lá mais para diante, na praia do Restelo, continua um velho de aspeito venerando, meneando três vezes a cabeça descontente, ó glória de mandar, ó vã cobiça."
Manuel Alegre, Jornada de África
Colocado por delta
21.8.07
0 comments